segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Meu porto é além de todo cais (Ângelo Monteiro)

Eis o texto solicitado por Malosti, intitulado Afinal, O Que Têm a Dizer Os Novos Poetas de Taubaté?:
De repente, sem que ninguém  desse conta, eles começaram a surgir de todos os lados. Foram se aproximando como quem não quer nada e se apresentando como “poetas”, esta espécie julgada extinta de que já ninguém mais se lembrava. Foram entrando, mostrando a cara, entrando sem pedir licença –como o sujeito que entra quietinho, senta no último banco da última fileira e, quando menos se espera, acaba tomando conta do pedaço.  Inconvenientes. Enxeridos. Ninguém os chamou, e eles vieram. Estranhamos: de onde é esta fauna tão diversificada saiu? De qual buraco, por que caminhos, onde é que estavam até agora? O que querem? Com seus poemas inofensivos e batidos, foram se infiltrando e tomando espaço. A impressão que se tem é que eles estão p or toda parte. Nos teatros. Nos prédios das associações de classe. Nos palcos. Na TV. Nas esquinas. Nas praças. No rádio. No Senado Federal.  Aliás, alguém sabe dizer qual foi a última vez que a palavra “Taubaté” foi proferida no Senado federal? Foi pra falar deles. E eles continuam. Entregam livros. Recebem certificados. Enchem as redes sociais de sandices, erros gramaticais, gritos por justiça -os poemas lá deles. Reclamam que não havia ninguém para cuidar do lobo-guará, discutem, saem na porrada. Publicam livros. Apontam o dedo. Alguns deles nem sabem exatamente o que querem dizer. Fazem saraus em praça pública, organizam concursos, lotam auditórios pequenos ou grandes, trocam poemas, fotografam como malucos. Formam e extinguem grupos como quem troca de roupa. E, não satisfeitos com a abrangência local, passaram a chamar outros loucos das adjacências para corroborar as insanidades: Pinda. São José. Campos. Aparecida. Monteiro Lobato. Jacareí. Varam as madrugadas. Achincalham políticos (uns palhaços incorrigíveis, todos eles). Trocam impressões entre si, anotam nomes de autores e livros, procuram na internet, vivem com papel e caneta à mão, brigam com os pais, sonham com outras paisagens, botam o dedo na ferida dos outros sem que os outros autorizem. Alguns não têm nem emprego, e não podem ver um microfone disponível. Bebem muita cerveja e outras porcarias. Fumam cigarros –e outras porcarias. São pederastas. Cínicos. Sujos. Chegam a questionar a Deus. Alguns são ateus –e ainda confessam! Defendem o homossexualismo, o fim dos preconceitos e a liberdade de pensamento. Por isso se escondem quando passa o carro da polícia. Falam palavrão e olham fixamente a bunda de nossas filhas na rua, sem que a gente perceba. Aliás, são loucos para engravidar a filha da gente. Dizem que trazem em si a “semente da poesia”, hippies atrasados que perderam o bonde da Hist� �ria –mas não o da esperança. Por isso são pálidos, orgulhosos, arrogantes, metidos a intelectuais da Dutra. Só pensam neles. Não ligam para a fome na África, para a crise do euro nem para Academias de Letras. Aliás, detestam Academias e seus odores de naftalina. Passam a maior parte do tempo a criar e organizar verdadeiros bacanais da palavra a céu aberto. O resto do tempo, não fazem nada. Não produzem para a economia do município, não geram receita, não contribuem para estatísticas, não recolhem impostos e não consomem como as pessoas normais. Dizem que só a cultura e a reforma da educação salvarão o País. Cuidado, ao cruzar com eles. São perigosos –é só ver o brilho que trazem nos olhos, quase em chamas. São excluídos –trazem livros nas mochilas e nunca têm dinheiro para nada. E teimam em carregar nas costas o peso imenso de cruzes imaginárias. E insistem em proferir ao vento seus versos que ninguém entende.  E insistem em semear esperança na dura insensatez do asfalto.

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