quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Eu queria mesmo é que minhas palavras fizessem parte do chão como os lagartos fazem. Eu queria que minhas palavras de joelhos no chão pudessem ouvir as origens da terra (Manoel de Barros)

O Brasil é um país em adiantado processo de imbecilização. Não é necessário, para constatar a veracidade desta afirmação, ler jornais ou revistas ou assistir aos jornais de maior audiência na TV. Basta ligar o rádio e conversar com uma ou duas pessoas na rua. Bom, conversar é maneira de dizer. Tente, no máximo, fazer contato. Parece que falam uma língua que não é a portuguesa, com trejeitos que desconhecemos, olhares de quem espera uma mínima oportunidade de levar qualquer tipo de vantagem. Um país sem educação, sem cultura e sem memória. Por isso me atenho a Suassuna, Zé Lins, Monteiro Lobato, João Cabral, Gonzagão, Antonio Nóbrega, Pena Filho, Leminski, Mendes Brandão. Para enxergar o que restou daquilo que um dia chamados de País. Somos apenas um amontoado que não sabe sequer para onde está indo. Evangélicos xiitas, defensores dos animais, bolsistas do governo, politiquinhos, pseudo-escritores, facebookianos, discursadores sem mensagem, gente que dá entrevista na televisão sem jamais ter lido um único livro, petistas, ambientalistas, curadores de bienal, acadêmicos, menininhas erotizadas aos dez anos, pais pusilânimes e permissivos, rainhas dos baixinhos, cozinheiros e suas manias, mulheres nuas que mais se parecem com robôs, garanhões marombados, padres escritores e suas coreografias idiotas, executivos tentando aprender a neolinguagem dos negócios, aviões que caem, classe média andando de navio sem nem saber localizar no mapa o Estado da Paraíba. Estamos a caminho do extermínio intelectual e moral, numa espécie de antropofagia involuntária. No fundo, no fundo, já perdemos a luta para a ignorância e o primitivismo.

Redigi finalmente o texto de apresentação para o Mar de Amares.
Ei-la:

Sarangerel, Blimunda, Vassilissa, Camoã e Simone (pilar).
Cinco mulheres, cinco memórias que resistem à passagem dos anos e à imensidao do tempo.
A primeira desafiou impérios, ditaduras, ideologias e cárceres para, quase no fim da vida, retornar ao amor que havia sido deixado em lugar tão distante (O Planalto e a Estepe, Pepetela).
A segunda nasceu com o dom de, quando em jejum, ver o que vai dentro da alma das pessoas. Condenada, lutou com e por seu amado até que as esperanças fossem esquecidas e, as passarolas, derrubadas (Memorial do Convento, José Saramago).
Já a terceira rebelou-se, ainda que tardiamente, contra a sina que vinha de avó a neta. Cansou-se e, resoluta, agarrou-se ao sonho como quem se agarra à vida. Ou ao amor pela literatura (Mediterraneo, Gabriele Salvatores).
A quarta nasceu de uma estrela que brilhava em meio à noite escura, enquanto procurávamos entendimento em meio ao negror do oceano. Nasceu Camoã porque nome composto de umidade e silêncio (Ponta da Praia, Santos, 1993).
Já Simone (pilar) é porto. Casa de abrigo e refrigério. Doçura de noites calmas e esperanças renovadas -quase que diariamente. Ancoradouro de fé, colunas de ternura, orvalho sereno em meio à serrania (Campos do Jordão, 1994).
Ao fim de tudo, são cinco histórias de amor, cinco desejos da carne e do espírito, mulheres cuja matéria é a mesma de que são feitos os sonhos e os corações.
Este é um livro que fala de amor.

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